A felicidade das crianças é um assunto relativamente recente na vida das famílias e nas conversas de mães. Antigamente as preocupações eram apenas sobre a saúde física, os estudos e como equilibrar as contas com mais um membro na família. Não se olhava para os sentimentos dessa criança e acreditava-se que criança era naturalmente feliz. A infância por si só se encarregava disso.
Muitas das crianças daquela geração cresceram, tornaram-se pais e mães e por terem essa lacuna da felicidade infantil, somada a novos estudos e práticas de parentalidade, passaram a olhar para essa temática sob outra perspectiva. Passamos a nos preocupar com a felicidade de nossos pequenos (ainda bem).
Mas o que será que faz nossos filhos felizes?
Um estudo no Brasil em 2014, com 200 crianças de 5 a 12 anos, de escolas públicas e privadas, avaliou qual é o conceito de felicidade em crianças. Pela voz das próprias crianças, a felicidade é associada principalmente a sentimentos, lazer, família, amizades, necessidades básicas/desejos, escola, não violência e ações morais, nesta ordem de prevalência (Tabela 1). Entre as respostas dadas por meninas e meninos, foram observados duas diferenças significativas. Para as meninas a felicidade está associada primeiramente a sentimentos e emoções positivas, enquanto para os meninos a principal menção são os conteúdos de lazer, atividades físicas e divertidas. Outro resultado interessante deste estudo, é que as crianças da faixa etária de 9 a 10 anos foram as que mais mencionaram a família como o conceito de felicidade. Os autores atribuem isso dois pontos: crianças de idades maiores são capazes de entender conceitos mais abstratos, como “família”, para darem suas respostas; a aproximação da adolescência permite que elas vejam os defeitos dos pais, e não mais no lugar idealizados da idades menores, e daí a associação dessas figuras com a felicidade (ou com a falta dela) (GIACOMONI; SOUZA, HUTZ, 2014).
Fonte: GIACOMONI; SOUZA, HUTZ, 2014.
Outro grupo de pesquisadores, agora na Itália, fizeram uma revisão em 2022 de 124 estudos para identificar associações relevantes entre o funcionamento familiar e a felicidade de crianças e adolescentes. Os estudos examinados destacaram que o aumento da coesão familiar e da adaptabilidade, ou seja, práticas familiares positivas, foram associados a níveis mais elevados de felicidade em crianças e adolescentes. Os autores apontam ainda que, tanto meninas como meninos, consideram que a comunicação positiva com seus pais está diretamente associada ao aumento da felicidade. Para os adolescentes, poder se expressar livremente dentro de casa está associado com a maior satisfação na vida. (IZZO; BAIOCCO; PISTELLA, 2022).
É curioso notar que em nenhum destes estudos foi apontado como fatores de promoção da felicidade em crianças e adolescentes práticas como ter um carro maior, uma casa mais bonita, tonelada de brinquedos colecionáveis, festa de aniversário com presença de toda a Disneylândia, mais dinheiro para família ou mães sobrecarregadas para dar conta de tudo isso.
Nossos filhos querem presença, momentos, diversão, segurança e espaço para serem eles mesmos.
Não estou dizendo que oferecer todas essas coisas é errado e traz infelicidade para nossas casas. Muito pelo contrário, são coisas que nos trazem conforto (fora a parte da mãe sobrecarregada). Que bom quando podemos proporcionar isso a eles, e também a nós. Mas meu ponto aqui é, onde estamos concentrando nossas energias? Será que nossas preocupações e empenhos estão sendo colocados nos caminhos que de fato vão levar nossos filhos para esse lugar de maior felicidade?
Eu não tenho a resposta certa (e bem na verdade não sei se ela existe). Mas acredito que cabe a cada uma de nós refletir sobre tudo isso, e talvez mudarmos um pouco nosso foco e nos concentrarmos naquilo que nossos filhos estão de fato nos pedindo.
Referências:
GIACOMONI, C. H.; SOUZA, L. K; HUTZ, C. S. O conceito de felicidade em crianças. Psico-USF, 19 (1), 2014.
IZZO, F; BAIOCCO, R., PISTELLA, J. Children’s and Adolescents’ Happiness and Family Functioning: A Systematic Literature Review. Int. J. Environ. Res. Public Health, 16, 2022.
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