Quando 7 em cada 10 mães “sorriem” para esconder a dor
- Nicole Amorim

- 18 de set.
- 3 min de leitura
Há um dado que deveria nos incomodar profundamente: 7 em cada 10 mulheres escondem ou minimizam seus sintomas de saúde mental durante a gravidez e o pós-parto. Isso não é “drama” nem “fase”. É silenciamento por estigma, e ele custa vidas, desenvolvimento infantil e qualidade de vida de famílias inteiras.
Alianças internacionais em saúde mental materna repetem esse alerta, e a literatura recente reforça: medo de julgamento e desinformação fazem com que a maioria oculte o que sente, atrasando diagnóstico e tratamento.
Na França, é comum o uso do termo “dépression souriante” (depressão sorridente) para descrever exatamente esse fenômeno onde a mulher aparenta estar bem — sorri, trabalha, “funciona” — enquanto por dentro enfrenta tristeza, ansiedade, exaustão e culpa. É uma depressão mascarada: os sinais estão lá, mas são escondidos para caber na narrativa de que a maternidade “tem que ser feliz”.

Importante: não é uma categoria diagnóstica formal (DSM/CID), e sim um modo de apresentação do sofrimento.
No período perinatal, esse fenômeno aparece com força. A exigência de “dar conta de tudo”, a ideia de que “quem tem bebê tem que estar feliz” e o receio de ser rotulada como “mãe ruim” empurram mulheres para o sorriso automático. Resultado: profissionais, parceiros e redes de apoio não veem. E o que não se vê, não se cuida. A comunidade científica é clara: sem triagem ativa e conversas diretas sobre saúde mental, os casos seguem invisíveis.

Mas afinal, por que tantas escondem?
Estigma: medo de julgamento, culpa e mitos sobre “amor materno incondicional”.
Desinformação: dificuldade de reconhecer que o que sentem é tratável; desconhecimento sobre saúde mental no período perinatal.
Falta de triagem sistemática: quando ninguém pergunta, a tendência é calar. o cuidado chega tarde (ou não chega).
Como reconhecer sinais quando há um “sorriso” por cima
Mesmo mascarados, alguns indícios se repetem no pós-parto: tristeza persistente, ansiedade intensa, culpa paralisante, alterações de sono e apetite, irritabilidade, sensação de inadequação, ideias negativas recorrentes. O quadro é mais duradouro e incapacitante do que o “baby blues” e exige avaliação profissional.
“Depressão sorridente” não uma etiqueta para o julgamento, mas um alerta para investigação, rastreio e tratamento. Por isso, se a mãe diz que “está tudo bem”, mas o corpo e o cotidiano contam outra história, a escuta precisa se aprofundar!
O que fazer?
Pessoas, serviços e empresas:
Pergunte de verdade. Perguntas diretas e sem julgamento abrem portas que o estigma fecha. Triagem ativa é prática recomendada e economiza tempo de sofrimento.
Normalize o cuidado. Repetir que depressão e ansiedade perinatal são tratáveis e que buscar ajuda é cuidado com a mãe e com o bebê.
Ofereça caminhos concretos. Encaminhe para avaliação psicológica/psiquiátrica, grupos de apoio e serviços de referência da rede local.
No trabalho, ajuste o ambiente. Flexibilidade, políticas claras de licença, retorno gradual e canais de apoio psicológico reduzem riscos e afastam o silêncio.
Se 7 em cada 10 mulheres escondem o que sentem, o problema não está nas mães, está no sistema que as cala. Enquanto o sorriso for condição de aceitação social, a “depressão sorridente” seguirá adoecendo em silêncio.
Nosso compromisso é tirar esse sofrimento da sombra: informação confiável, formação de profissionais, mudanças institucionais e políticas públicas que incluam saúde mental como parte do cuidado perinatal do pré-natal ao fim do primeiro ano do bebê.
Se você se reconhece nesse texto (ou reconhece alguém): você não está sozinha. Procure um/uma profissional de saúde mental ou uma unidade da sua rede. Falar é o primeiro passo; ser acolhida é um direito.
Fontes essenciais:
Maternal Mental Health Alliance (dados sobre subnotificação e estigma: “70% of mothers hide or downplay their struggles”);
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